quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

O Retorno dos Mortos-Vivos (El Ataque de los Muertos Sin Ojos, Espanha, 1973)


Vocês verão os templários retornarem dos mortos! Destruiremos tudo e todos! Somos imortais! E vocês?

 É interessante notar como o mercado brasileiro de vídeo VHS já lançou uma quantidade infindável de filmes que não estão mais disponíveis. Quando a febre dos aparelhos de vídeo cassete iniciou no país, por volta de meados dos anos 1980, surgiu uma grande quantidade de distribuidoras de filmes em VHS que eram tão pequenas e desconhecidas quanto os filmes que lançavam no mercado. Tanto é que a maioria faliu e desapareceu há muitos anos, deixando suas fitas perdidas principalmente em pequenas locadoras de bairro ou sebos espalhados pelo Brasil. Porém, muitos desses filmes desconhecidos, de todos os gêneros, são verdadeiras preciosidades e tornaram-se raridades fora de catálogo para colecionadores e apreciadores do cinema menos convencional. Principalmente agora, com a proliferação dos filmes em discos DVD, que estão tornando-se cada vez mais populares e diminuindo a atenção dispensada pelo público às fitas VHS, num movimento similar ao que já aconteceu com a música, entre os nostálgicos discos de vinil e os modernos CD´s.
Um filme de horror em especial, com o sonoro título de “O Retorno dos Mortos-Vivos” (The Return of the Evil Dead), lançado no Brasil pela extinta “Visocopy”, é uma rara produção espanhola de 1973 que exemplifica muito bem o que foi exposto acima. É um filme pouco conhecido no Brasil, de baixo orçamento no mais tradicional “horror bagaceiro”, e típico representante do cinema “trash”, ou seja, com roteiro óbvio, diálogos banais, situações previsíveis, atores canastrões e amadores, efeitos toscos e tantas outras deficiências não propositais que o tornam exatamente por isso um filme que desperta interesse e principalmente proporciona um inusitado momento de entretenimento. Sem contar outros motivos que ajudam a torná-lo ainda mais especial, como sua raridade e dificuldade de acesso, sendo um filme espanhol com mais de quarenta anos desde sua obscura produção. Além de ser um exemplar tipicamente influenciado pelo clássico filmado em preto e branco “A Noite dos Mortos-Vivos” (The Night of the Living Dead), dirigido por George A. Romero em 1968, que trazia basicamente um grupo de pessoas encurraladas numa casa de campo enfrentando a fúria assassina de uma multidão de zumbis famintos por carne humana. Em “O Retorno dos Mortos-Vivos”, a história mostra um grupo de sobreviventes de uma pequena cidade refugiados numa igreja, sendo ferozmente atacados por mortos-vivos portando espadas em busca de vingança contra o que lhes aconteceu no passado.
 O filme inicia mostrando uma seita da Idade Média realizando rituais satânicos num castelo de estilo gótico. Eles são templários que trouxeram do Oriente o segredo da vida eterna, realizando sacrifícios humanos para as supremas forças do mal, arrancando o coração das vítimas, comendo suas vísceras e bebendo o sangue. Revoltados com os assassinatos nas cerimônias demoníacas, os aldeões locais capturam os templários e os executam queimando-os vivos em fogueiras. Uma vez os satanistas prometendo retornarem do mundo dos mortos para se vingarem, os aldeões então queimaram primeiro os seus olhos antes de atearem fogo em seus corpos, para com isso impedirem sua volta. Um dos próprios moradores da cidade explica o folclore em torno dos templários: “De acordo com a lenda, os aldeões queimaram seus olhos para que não pudessem voltar, para se vingarem. A superstição diz que eles seguem o som!”.
Muitos anos depois, a pequena vila portuguesa de Bouzano está se preparando para comemorar uma festa para lembrar a vitória de seus antepassados sobre os templários, onde eles simulam a execução dos satanistas com bonecos presos em fogueiras. Para alegrar ainda mais a festa, o prefeito Duncan (Fernando Sancho) e seu assistente Howard (Frank Blake), contratam um técnico americano em fogos de artifício, Jack Marlowe (Tony Kendall). Ao chegar à cidade, Jack reencontra uma antiga namorada, a agora noiva do prefeito, Srta. Vivian (Esther Roy), com quem acaba se reaproximando e com isso despertando a ira de Howard, que estava apaixonado pela jovem.
Enquanto os habitantes do vilarejo se divertem com a animada festa noturna, dançando e assistindo a queima dos fogos de artifício, próximo dali, no antigo castelo em ruínas dos templários, eles ressurgem do mundo dos mortos saindo de suas tumbas para consumarem sua vingança prevista quando foram barbaramente executados nas fogueiras. Eles se reúnem em grande quantidade, cavalgando cavalos mortos e portando espadas afiadas, e se dirigem à cidade para iniciarem um massacre. Após sangrenta carnificina, numa gritaria sem fim, com mortos e feridos para todos os lados, um grupo de sobreviventes se refugia numa igreja, sendo encurralado pelos templários esqueléticos. Formado pelo herói mocinho Jack, sua namorada Vivian, o prefeito corrupto e sem escrúpulos Duncan e seu capanga Howard. Ainda tem um casal, Bert (Ramón Lillo) e Amalia (Lone Fleming), com sua pequena filha Nancy (Maria Nuria), uma bela jovem, Monica (Loreta Tovar), que havia visto o namorado ser assassinado, e o vigia do local, um retardado corcunda, Murdo (José Canalejas), que ajudou  no retorno dos mortos-vivos matando uma mulher diante de suas tumbas, mas que foi ignorado pelas caveiras ambulantes. Uma vez encurralados na igreja por uma multidão de mortos-vivos, o grupo vai aos poucos sendo dizimado violentamente enquanto lutam pela sobrevivência, aguardando a chegada do amanhecer. 
 Algumas cenas são bastante interessantes, destacando as sequências em que os templários têm seus olhos dolorosamente queimados por tochas ardentes em fogo; ou quando um homem tem sua mão e outro sua cabeça violentamente decepados em golpes precisos das espadas dos mortos-vivos; ou ainda na brutal chacina dos habitantes do pequeno vilarejo, numa correria desenfreada com sangue e corpos caindo aos montes, vítimas dos templários vingadores.
Os efeitos especiais são extremamente precários, principalmente num momento em que o herói Jack arremessa sobras de fogos de artifício nos zumbis com o objetivo de derrotá-los. Alguns caem mostrando claramente tratarem-se de simples bonecos imóveis, num efeito exageradamente tosco. O roteiro tem erros grotescos de continuidade e diálogos tão infantis que nos incitam a torcer para o sucesso do plano de vingança dos bruxos medievais. Porém, os figurinos dos mortos-vivos são bastante convincentes, dando a impressão sombria de esqueletos podres vestindo grandes capas surradas e desgastadas pelo tempo, auxiliados por uma fotografia escura.
“O Retorno dos Mortos-Vivos” é o segundo filme de uma série de quatro dentro do mesmo universo ficcional, porém com histórias independentes. Sendo precedido por “A Noite do Terror Cego” (1972) e tendo outras duas sequências posteriores, “O Galeão Fantasma” (1974) e “A Noite das Gaivotas” (1975), todos dirigidos por Amando De Ossorio e constituindo-se numa cultuada tetralogia do cinema fantástico envolvendo a sempre fascinante temática de “mortos-vivos”.

(Texto originalmente em Fevereiro de 2003, publicado em 10/12/2005 no blog www.juvenatrix.blogspot.com.br)

O Retorno dos Mortos-Vivos (El Ataque de los Muertos Sin Ojos / The Return of the Evil Dead / The Return of the Blind Dead, Espanha, 1973). Ancla Century / Atlas International. Duração: 83 minutos. Direção e roteiro de Amando De Ossorio. Produção de Raymond Planta. Fotografia de Michael Mila. Edição de Joseph Anthony. Maquiagem de Joe Louis Campos. Música de Tony Abril. Elenco: Tony Kendall, Fernando Sancho, Esther Roy, Frank Blake, Lone Flemming.
(Juvenatrix - Fev. 2003)

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